quinta-feira, 28 de maio de 2015

A poética de Santoro




POESIA E ADULTÉRIO - Em 1999 o Pofessor Fernando Santoro publicou pela Editora Sette Letras o livro "Imaculada". Uma coletânea de poemas e textos poéticos tratando de temas como o amor, a paixão e o adultério. Tudo calcado nos seus estudos sobre Filosofia Antiga e conceitos da poética de Aristóteles. Sobre esse tema Aristóteles escreveu: "Falemos da poesia - dela mesma e das suas espécies, da efetividade de cada uma delas, da composição que se deve dar aos mitos, se quisermos que o poema resulte perfeito, e, ainda, de quantos e quais os elementos de cada espécie e, semelhantemente, de tudo quanto pertence a esta indagação - começando, como é natural, pelas coisas primeiras. A epopéia, a tragédia, assim como a poesia ditirâmbica e a maior parte da aulética e da citarística, todas são, em geral, imitações. Diferem, porém, umas das outras, por três aspectos: ou porque imitam por meios diversos, ou porque imitam por modos diversos e não da mesma maneira".
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Leiam, abaixo, a poética de Santoro.



Soneto Casmurro


- Oh! Flor do céu! Oh! Flor cândida e pura!
Pétalas de nuvem, cálice doce
Teus lábios todos, laivos de ternura,
Dizem que guardam o bem que um anjo trouxe...

- Vem, beija-flor. Provar deste meu mel
Se tens desejo, hás de ter coragem
Supera a paliçada do quartel,
Me livra do espinhaço selvagem...

Roçando-me passando entre espinhos,
Descubro agonizando uns passarinhos:
“Perde-se a vida, ganha-se a batalha!”

Me diz um desses mártires do amor...
E torno – vendo: espinhos são da flor!
“Ganha-se a vida? Perde-se a batalha...”

(Ora!)




Safira

Íris,
Mais que alga marinha, verdíssimas
Que no vento a nuvem, sutilíssimas
Que asas de beija-flor, trementes.

Cílios,
Mais que agulha de fiar, finíssimos
Que a noite mais funda, escuríssimos
Que um veludo puro, envolventes.

Lábios,
Mais que a tez da papoula, escarlates,
Que o hálito das brasas, quentíssimos,
Que a luz da preamar, vazantes.




Nos afronautas

A tua roupa branca de sexta-feira
não desvendava o teu corpo ainda mais branco
mas suspendia-o por sobre o chão
quando dançavas ao sabor dos tambores

Eu não decifro o teu sorriso
não sei se é inocente ou cínico ou vaidoso
Eu não decifro os teus olhos
não sei se fogem ou se procuram ou se escondem

Tu és para mim a página em silêncio,
és o lençol arrumado, o vestido no armário,
Tu és o branco substantivo onde eu branco verbo

esquecendo tudo, não pensando em nada


Para pensar!



Todos os homens aspiram à vida feliz e à felicidade, esta é uma coisa manifesta; mas, se muitos têm a possibilidade de alcançá-la, outros não a têm em virtude de algum azar ou vício de natureza (pois a vida feliz requer um certo acompanhamento de bens externos, em quantidade menor para os indivíduos dotados de melhores disposições e em quantidade maior para aqueles cujas disposições são piores), e outros, finalmente, tendo a possibilidade de ser felizes, imprimem desde o início uma direção errada na sua busca da felicidade. Aristóteles (Ética a Nicómaco)

Todos os homens têm, por natureza, desejo de conhecer...



Caros colegas, não esqueçam: o Professor Fernando Santoro está participando de um seminário no exterior e só volta dia 5 de Junho. Portanto, sua próxima aula só vai acontecer no dia 9 de Junho. Até lá todos os alunos devem mergulhar na leitura da Metafísica, de Aristóteles. E aproveitar o tempo para preparar  o trabalho que vai servir de avaliação do curso..
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Vale lembrar que o trabalho consiste num texto impresso com um mínimo de cinco e o máximo de dez páginas. O trabalho deve ser feito em grupo. Cada grupo deve escolher um trecho da Metafísica e desenvolver o seu trabalho. O texto deve traduzir o entendimento que o aluno/grupo teve do pensamento de Aristóteles. É importante que seja um texto claro, objetivo, com um português correto e que tenha como referência os conceitos utilizados no estudo da Filosofia.    
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Quem precisar de algum tipo de orientação, dica, ou apoio, pode contar com o responsável pela monitoria, Waldir Leite.
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domingo, 17 de maio de 2015

A teoria do prazer




Para Aristóteles, o prazer em sua constituição ontológica é semelhante à visão, como uma atividade acabada por toda a sua duração. Completa (teléia), indivisível, e não um movimento para vir a ser. Por isso a importância de refutar a tese platônica do prazer como repleção, retomada por Espeusipo como movimento ou geração. Aristóteles chega a dizer que sendo instantâneo o prazer poderia subsistir até fora do tempo – como na atividade perfeita dos deuses!

Mas Aristóteles tem dificuldade de aprender exatamente a constituição da completude do prazer, de modo que vai apresentar duas definições diferentes: uma primeira, na primeira redação da Ética a Eudemo, e uma segunda, na redação definitiva da teoria. As duas, porém, são conservadas na Ética a Nicômaco, de modo que não podemos afirmar categoricamente que a segunda supere por completo a primeira. As duas merecem ser consideradas.

O prazer é uma atividade desimpedida de uma disposição conforme a natureza.

Nesta primeira definição, o prazer é uma atividade (enérgeia), e portanto uma atualidade completa, e não um processo para tornar-se ou gerar algo. Duas características importantes a qualificam. Primeiro, a conformidade a disposição natural: esta condicionante é importantíssima para distinguir os prazeres conforme a natureza do homem virtuoso, dos prazeres conforme outras naturezas, e para não caracterizar como prazeres reais e sadios os que venham contra a natureza.

Esta ligação do prazer com as disposições naturais também fundamenta a distinção que Aristóteles faz entre prazeres próprios a determinada atividade e os prazeres que lhe estranhos e que funcionam não propriamente como prazeres, mas como obstáculos e desvios de atenção. Estes não são prazeres conforme a natureza daquela atividade. Natureza significa em todos esses casos uma tendência própria, uma índole, um pendor, seja da atividade, seja do agente.

A segunda característica é o eixo de toda essa definição: o ser desimpedido (anempódiston). O desimpedimento resgata a fisiologia cirenaica do prazer, mas com maior acuidade na definição. Equivale ao liso e fluente das compreensões antigas, contra o rugoso, o áspero, o que trava, impede e provoca atrito para a atividade. Mas a atividade desimpedida e fluente não é um movimento como aqueles pensavam, porque a atividade permanece inalterada e completa na sua atualidade efetiva. O desimpedimento também explica como o prazer propicia a melhor realização da atividade, quando ela está em melhores condições de se realizar, sem nenhum obstáculo.

Mas essa definição não satisfaz plenamente o filósofo. Que o prazer esteja relacionado a uma situação completa e efetiva não quer dizer que seja a atividade mesma da qual se diz que é prazerosa. Nem toda atividade conforme a natureza é necessariamente prazerosa quando desimpedida; uma vista que geralmente é agradável quando nítida e desimpedida pode recair, por exemplo, sobre uma cena desagradável. Além do mais, chamamos a atividade de prazerosa, mas seria ela mesma o prazer?
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(Trecho do livro "Arqueologia dos Prazeres", de Fernando Santoro)
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A indagação das causas e dos princípios





Visto que esta ciência (a filosofia) é o objeto das nossas indagações, examinemos de que causas e de que princípios se ocupa a filosofia como ciência; questão que se tomará muito mais clara se examinarmos as diversas ideias que formamos do filósofo. Em primeiro lugar, concebemos o filósofo principalmente como conhecedor do conjunto das coisas, enquanto é possível, sem contudo possuir a ciência de cada uma delas em particular. Em seguida, àquele que pode alcançar o conhecimento de coisas difíceis, aquelas a que só se chega vencendo graves dificuldades, não lhe chamaremos filósofo? De fato, conhecer pelos sentidos é uma faculdade comum a todos, e um conhecimento que se adquire sem esforço em nada tem de filosófico. Finalmente, o que tem as mais rigorosas noções das causas, e que melhor ensina estas noções, é mais filósofo do que todos os outros em todas as ciências. E, entre as ciências, aquela que se procura por si mesma, só pelo anseio do saber, é mais filosófica do que a que se estuda pelos seus resultados; assim como a que domina as mais é mais filosófica do que a que se encontra subordinada a qualquer outra. Não, o filósofo não deve receber leis, mas sim dá-las; nem é necessário que obedeça a outrem, mas deve obedecer-lhe o que seja menos filósofo. (...) Pois bem: o filósofo que possuir perfeitamente a ciência do geral tem necessariamente a ciência de todas as coisas, porque um homem em tais circunstâncias sabe, de certo modo, tudo quanto está compreendido sob o geral. Todavia, pode dizer-se também que se toma muito difícil ao homem alçar-se aos conhecimentos mais gerais; as coisas que são seus objetos como que estão mais distantes do alcance dos sentidos. (...) De tudo quanto dissemos sobre a própria ciência resulta a definição da filosofia que procuramos. É imprescindível que seja a ciência teórica dos primeiros princípios e das primeiras causas, porque uma das causas é o bem, a razão final. E que não é uma ciência prática, prova-o o exemplo dos que primeiramente filosofaram. O que, a princípio, levou os homens a fazerem as primeiras indagações filosóficas foi, como é hoje, a admiração. Entre os objetos que admiravam e que não podiam explicar, aplicaram-se primeiro aos que se encontravam ao seu alcance; depois, passo a passo, quiseram explicar os fenômenos mais importantes; por exemplo, as diversas fases da Lua, o trajeto do Sol e dos astros e, finalmente, a formação do universo. Ir à procura duma explicação e admirar-se é reconhecer que se ignora. (...) Portanto, se os primeiros filósofos filosofaram para se libertarem da ignorância, é evidente que se consagraram à ciência para saber, e não com vista à utilidade.
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(Metafísica, de Aristóteles)
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A vida de Aristóteles

                     


MORA NA FILOSOFIA - Neste vídeo um breve resumo da vida de Aristóteles. Desde o seu nascimento em Estagira, na Macedônia, passando por sua mudança para Atenas, o seu encontro com Platão e tudo o mais. Sua história, suas obras, aspectos curiosos e pitorescos. Vale a pena assistir...

quinta-feira, 7 de maio de 2015







O homem é o mais sábio de todos os seres, porque ele tem as mãos. - Anaxágoras

Arqueologia dos Prazeres, livro de Fernando Santoro


A vida sem festas é um longo caminho sem hospedarias.

MORA NA FILOSOFIA - Quantas vezes por dia nós sentimos prazer? Quantas vezes por dia buscamos o prazer? O livro “Arqueologia dos Prazeres”, do professor Fernando Santoro, resgata a discussão originária dos filósofos gregos sobre o tema, que nos encanta e atormenta. Afinal o prazer é um bem, identifica-se com a felicidade ou não? Deve ser perseguido, evitado, controlado? Capaz de dissecar o assunto e demonstrá-lo em aulas fascinantes para platéias cada vez mais numerosas, o filósofo Fernando Santoro nos apresenta um livro original e acessível. Nele acompanhamos, deliciados, o levantamento das teses ontológicas do prazer, sua reação com o repouso e o movimento, com o corpo e o intelecto, com a ação e a paixão. Hedonistas, estóicos, materialistas, cínicos, realistas, idea-listas: entenda como e por que algumas escolas defendem o prazer e por que outras o atacam. Saiba o que pensavam sobre o assunto os primeiros sábios, e como Empédocles, Demócrito, Aristóteles, Platão e Epicuro, entre outros gregos fundamentais, associavam o prazer à beleza e ao desejo.
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Um livro que se lê com muito prazer. Um trecho a seguir...

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A Escola Cirenaica foi fundada por Aristipo de Cirene, que acorreu jovem para Atenas atraído por Sócrates. O exemplo de domínio sobre os prazeres, a despeito da medida, inspirou suas ideias e sua conduta. Ademais, aprendeu muito bem a agilidade da palavra, a resposta na ponta da língua, como veremos. Os cirenaicos estabeleceram sua doutrina especialmente em torno da questão do prazer. Para eles, havia dois estados de alma: o prazer e a dor. Quanto à fisiologia, não lhes interessava o conhecimento da sua constituição para além do que servisse a fruí-lo, entendiam o prazer como um movimento suave e a dor como um movimento brusco, inspirados na teoria das sensações de Anaxágoras. O fim supremo é o movimento calmo que resulta em sensação. Por isso, não acreditavam em prazeres estáticos nem que a calma ou a ausência de dor equivalessem a qualquer prazer. Não faziam nenhuma distinção de valor entre os prazeres. Mesmo que a ação resultante e mgozo fosse vil ou vergonhosa, o prazer não deixava por isso de ser algo bom em si mesmo. 
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 A fruição do prazer é o bem supremo, e a felicidade é o acúmulo de prazeres isolados ao longo da vida. Nestes estão incluídos os prazeres passados e os futuros, mais como propiciadores de uma boa disposição do que como fruição de lembranças e expectativas, exauridas no tempo e vazias de sentido. Concentravam-se em viver o momento presente. Não calculavam trocar um prazer maior por dores menores no dia seguinte, porque o prazer do dia de hoje é certo e o futuro é duvidoso. A única coisa certa no futuro é a morte, o que justifica ainda mais concentrar as preocupações nas ocupações e sensações presentes.
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domingo, 3 de maio de 2015



Visto que esta ciência (a filosofia) é o objeto das nossas indagações, examinemos de que causas e de que princípios se ocupa a filosofia como ciência; questão que se tomará muito mais clara se examinarmos as diversas ideias que formamos do filósofo. Em primeiro lugar, concebemos o filósofo principalmente como conhecedor do conjunto das coisas, enquanto é possível, sem contudo possuir a ciência de cada uma delas em particular. Em seguida, àquele que pode alcançar o conhecimento de coisas difíceis, aquelas a que só se chega vencendo graves dificuldades, não lhe chamaremos filósofo? De fato, conhecer pelos sentidos é uma faculdade comum a todos, e um conhecimento que se adquire sem esforço em nada tem de filosófico. Finalmente, o que tem as mais rigorosas noções das causas, e que melhor ensina estas noções, é mais filósofo do que todos os outros em todas as ciências. E, entre as ciências, aquela que se procura por si mesma, só pelo anseio do saber, é mais filosófica do que a que se estuda pelos seus resultados; assim como a que domina as mais é mais filosófica do que a que se encontra subordinada a qualquer outra. Não, o filósofo não deve receber leis, mas sim dá-las; nem é necessário que obedeça a outrem, mas deve obedecer-lhe o que seja menos filósofo. (...) 
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Pois bem: o filósofo que possuir perfeitamente a ciência do geral tem necessariamente a ciência de todas as coisas, porque um homem em tais circunstâncias sabe, de certo modo, tudo quanto está compreendido sob o geral. Todavia, pode dizer-se também que se toma muito difícil ao homem alçar-se aos conhecimentos mais gerais; as coisas que são seus objetos como que estão mais distantes do alcance dos sentidos. (...) 
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De tudo quanto dissemos sobre a própria ciência resulta a definição da filosofia que procuramos. É imprescindível que seja a ciência teórica dos primeiros princípios e das primeiras causas, porque uma das causas é o bem, a razão final. E que não é uma ciência prática, prova-o o exemplo dos que primeiramente filosofaram. O que, a princípio, levou os homens a fazerem as primeiras indagações filosóficas foi, como é hoje, a admiração. Entre os objetos que admiravam e que não podiam explicar, aplicaram-se primeiro aos que se encontravam ao seu alcance; depois, passo a passo, quiseram explicar os fenômenos mais importantes; por exemplo, as diversas fases da Lua, o trajeto do Sol e dos astros e, finalmente, a formação do universo. Ir à procura duma explicação e admirar-se é reconhecer que se ignora. (...) Portanto, se os primeiros filósofos filosofaram para se libertarem da ignorância, é evidente que se consagraram à ciência para saber, e não com vista à utilidade.
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(Trecho da Metafísica)
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O verdadeiro sábio procura a ausênca de dor, e não o prazer.





O ESPIRITO DE ARISTÓTELES - Um CD com um repertório só com músicas gregas da antiguidade. A trilha sonora perfeita para ler a Metafísica, de Aristóteles...