sexta-feira, 17 de abril de 2015

Poética, Aristóteles



A Poética (em grego antigo: Περὶ ποιητικῆς; em latim: poiétikés), provavelmente registrada entre os anos 335 a.C. e 323 a.C. (Eudoro de Souza, 1993, pg.8), é um conjunto de anotações das aulas de Aristóteles sobre o tema da poesia e da arte em sua época, pertencentes aos seus escritos acroamáticos (para serem transmitidos oralmente aos seus alunos) ou esotéricos (textos para iniciados). Estes cadernos de anotações eram destinados às aulas do Liceu e serviam de guia para o professor Aristóteles, anotações esquemáticas destinadas a serem desenvolvidas em suas aulas e não para serem conhecidas através da leitura. Praticamente tudo que se conservou de Aristóteles faz parte das obras acroamáticas. É o primeiro escrito conhecido que procura especificamente analisar determinadas formas da arte e da literatura, também um registro limitado de como era a arte grega em seu tempo. 
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Para a aula do próximo dia 28 de abril, o Professor Santoro sugere a leitura de dois capítulos da Poética. Os capítulos 4 e 9, transcritos a seguir. A leitura vai servir para ajudar a entender alguns aspectos da Metafísica, texto principal do nosso curso. 

Poética, de Aristóteles - Cap. 4



Origem da poesia. Causas. História da poesia trágica e cômica. 

13. Ao que parece, duas causas, e ambas naturais, geraram a poesia. O imitar é congênito no homem (e nisso difere dos outros viventes, pois, de todos, é ele o mais imitador, e, por imitação, aprende as primeiras noções), e os homens se comprazem no imitado. 

14. Sinal disto é o que acontece na experiência: nós contemplamos com prazer as imagens mais exatas daquelas mesmas coisas que olhamos com repugnância, por exemplo, [as representações de] animais ferozes e [de] cadáveres. Causa é que o aprender não só muito apraz aos filósofos, mas também, igualmente, aos demais homens, se bem que menos participem dele. Efetivamente, tal é o motivo por que se deleitam perante as imagens: olhando-as, aprendem e discorrem sobre o que seja cada Uma delas, [e dirão], por exemplo, "este é tal". Porque, se suceder que alguém não tenha visto o original, nenhum prazer lhe advirá da imagem, como imitada, mas tão-somente da execução, da cor ou qualquer outra causa da mesma espécie. 

15. Sendo, pois, a imitação própria da nossa natureza (e a harmonia e o ritmo, porque é evidente que os metros são partes do ritmo), os que ao princípio foram mais naturalmente propensos para tais coisas pouco a pouco deram origem à poesia, procedendo desde os mais toscos improvisos. 

16. A poesia tomou diferentes formas, segundo a diversa índole particular [dos poetas]. Os de mais alto ânimo imitam as ações nobres e das mais nobres personagens; e os de mais baixas inclinações voltaram-se para as ações ignóbeis, compondo, estes, vitupérios, e aqueles, hinos e encômios. Não podemos, é certo, citar poemas deste gênero, dos [poetas que viveram] antes de Homero, se bem que, verossimilmente, muitos tenham existido; mas, a começar em Homero, temos o Margites e outros poemas semelhantes, nos quais, por mais apto, se introduziu o metro jâmbico (que ainda hoje assim se denomina porque nesse metro se injuriavam [iámbizon]). De modo que, entre os antigos, uns foram poetas em verso heróico, outros o foram em verso jâmbico. 

17. Mas Homero, tal como foi supremo poeta no gênero sério, pois se distingue não só pela excelência como pela feição dramática das suas imitações, assim também foi o primeiro que traçou as linhas fundamentais da comédia, dramatizando, não o vitupério, mas o ridículo. Na verdade, o Margites tem a mesma analogia com a comédia que têm a Ilíada e a Odisséia com a tragédia. 

18. Vindas à luz a tragédia e a comédia, os poetas, conforme a própria índole os atraía para este ou aquele gênero de poesia, uns, em vez de jambos, escreveram comédias, outros, em lugar de epopéias, compuseram tragédias, por serem estas últimas formas mais estimáveis do que as primeiras. 

19. Examinar, depois, se nas formas trágicas [a poesia austera] atinge ou não atinge a perfeição [do gênero], quer a consideremos em si mesma, quer no que respeita ao espetáculo — isso seria outra questão. 

20. Mas, nascida de um princípio improvisado (tanto a tragédia, como a comédia: a tragédia, dos solistas do ditirambo; a comédia, dos solistas dos cantos fálicos, composições estas ainda hoje estimadas em muitas das nossas cidades), [a tragédia] pouco a pouco foi evoluindo, à medida que se desenvolvia tudo quanto nela se manifestava; até que, passadas muitas transformações, a tragédia se deteve, logo que atingiu a sua forma natural. Esquilo foi o primeiro que elevou de um a dois o número dos atores, diminuiu a importância do coro e fez do diálogo protagonista. Sófocles introduziu três atores e a cenografia. Quanto à grandeza, tarde adquiriu [a tragédia] o seu alto estilo: [só quando se afastou] dos argumentos breves e da elocução grotesca, [isto é,] do [elemento] satírico. Quanto ao metro, substituiu o tetrâmetro [trocaico] pelo [trímetro] jâmbico. Com efeito, os poetas usaram primeiro o tetrâmetro porque as suas composições eram satíricas e mais afins à dança; mas, quando se desenvolveu o diálogo, o engenho natural logo encontrou o metro adequado; pois o jambo é o metro que mais se conforma ao ritmo natural da linguagem corrente: demonstra-o o fato de muitas vezes proferirmos jambos na conversação, e só raramente hexâmetros, quando nos elevamos acima do tom comum.

21. Quanto ao número de episódios e outros ornamentos que se haja acrescentado a cada parte, consideremos o assunto tratado; muito laborioso seria discorrer sobre tudo isso em pormenor.


Poética, de Aristóteles - Capitulo 9



Poesia e história. Mito trágico e mito tradicional. Particular e universal. Piedade e terror. Surpreendente e maravilhoso. 

50. Pelas precedentes considerações se manifesta que não é ofício de poeta narrar o que aconteceu; é, sim, o de representar o que poderia acontecer, quer dizer: o que é possível segundo a verossimilhança e a necessidade. Com efeito, não diferem o historiador e o poeta por escreverem verso ou prosa (pois que bem poderiam ser postos em verso as obras de Heródoto, e nem por isso deixariam de ser história, se fossem em verso o que eram em prosa) — diferem, sim, em que diz um as coisas que sucederam, e outro as que poderiam suceder. Por isso a poesia é algo de mais filosófico e mais sério do que a história, pois refere aquela principalmente o universal, e esta o particular. Por "referir-se ao universal" entendo eu atribuir a um indivíduo de determinada natureza pensamentos e ações que, por liame de necessidade e verossimilhança, convém a tal natureza; e ao universal, assim entendido, visa a poesia, ainda que dê nomes às suas personagens; particular, pelo contrário, é o que fez Alcibíades ou o que lhe aconteceu. 

51. Quanto à comédia, já ficou demonstrado [este caráter universal da poesia]; porque os comediógrafos, compondo a fábula segundo a verossimilhança, atribuem depois às personagens os nomes que lhes parece, e não fazem como os poetas jâmbicos, que se referem a indivíduos particulares. 

52. Mas na tragédia mantêm-se os nomes já existentes. A razão é a seguinte: o que é possível é plausível; ora, enquanto as coisas não acontecem, não estamos dispostos a crer que elas sejam possíveis, mas é claro que são possíveis aquelas que aconteceram, pois não teriam acontecido se não fossem possíveis. 

53. Todavia, sucede também que em algumas tragédias são conhecidos os nomes de uma ou duas personagens, sendo os outros inventados; em outras tragédias nenhum nome é conhecido, como no Anteu de Agatão. em que são fictícios tanto os nomes como os fatos, o que não impede que igualmente agrade. Pelo que não é necessário seguir à risca os mitos tradicionais donde são extraídas as nossas tragédias; pois seria ridícula fidelidade tal, quando é certo que ainda as coisas conhecidas são conhecidas de poucos, e contudo agradam elas a todos igualmente. 

54. Daqui claramente se segue que o poeta deve ser mais fabulador que versificador; porque ele é poeta pela imitação e porque imita ações. E ainda que lhe aconteça fazer uso de sucessos reais, nem por isso deixa de ser poeta, pois nada impede que algumas das coisas que realmente acontecem sejam, por natureza, verossímeis e possíveis e, por isso mesmo, venha o poeta a ser o autor delas. 

55. Dos mitos e ações simples, os episódicos são os piores. Digo "episódico" o mito em que a relação entre um e outro episódio não é necessária nem verossímil. Tais são os mitos de maus poetas, por [imperícia] deles, e às vezes de bons poetas, por [condescendência com os] atores. É que, para compor partes declamatórias, chegam a forçar a fábula para além dos próprios limites e a romper o nexo da ação. 56. Como, porém, a tragédia não só é imitação de uma ação completa, como também de casos que suscitam o terror e a piedade, e estas emoções se manifestam principalmente quando se nos deparam ações paradoxais, e, perante casos semelhantes, maior é o espanto que ante os feitos do acaso e da fortuna (porque, ainda entre os eventos fortuitos, mais maravilhosos parecem os que se nos afiguram acontecidos de propósito — tal é, por exemplo, o caso da estátua de Mítis em Argos, que matou, caindo-lhe em cima, o próprio causador da morte de Mítis, no momento em que a olhava —, pois fatos semelhantes não parecem devidos ao mero acaso), daqui se segue serem indubitavelmente os melhores os mitos assim concebidos.


Ética a Nicomaco, Capitulo 7 do Livro 10




Ao mesmo tempo em que explica a Metafísica, o professor Fernando Santoro se utiliza de trechos da Ética a Nicomaco para melhor ilustrar sua interpretação da filosofia de Aristóteles. O trecho abaixo deve ser lido para a aula do próximo dia 28 de abril



Se a felicidade é atividade conforme à virtude, será razoável que ela esteja também em concordância com a mais alta virtude; e essa será a do que existe de melhor em nós. Quer seja a razão, quer alguma outra coisa esse elemento que julgamos ser o nosso dirigente e guia natural, tornando a seu cargo as coisas nobres e divinas, e quer seja ele mesmo divino, quer apenas o elemento mais divino que existe em nós, sua atividade conforme à virtude que lhe é própria será a perfeita felicidade. Que essa atividade é contemplativa, já o dissemos anteriormente. Ora, isto parece estar de acordo não só com o que muitas vezes asseveramos, mas também com a própria verdade. Porque, em primeiro lugar, essa atividade é a melhor (pois não só é a razão a melhor coisa que existe em nós, como os objetos da razão são os melhores dentre os objetos cognoscíveis); e, em segundo lugar, é a mais contínua, já que a contemplação da verdade pode ser mais contínua do que qualquer outra atividade. E pensamos que a felicidade tem uma mistura de prazer, mas a atividade da sabedoria filosófica é reconhecidamente a mais aprazível das atividades virtuosas; pelo menos, julga-se que o seu cultivo oferece prazeres maravilhosos pela pureza e pela durabilidade, e é de supor que os que sabem passem o seu tempo de maneira mais aprazível do que os que indagam. 

Além disso a auto-suficiência de que falamos deve pertencer principalmente à atividade contemplativa. Porque, embora um filósofo, assim como um homem justo ou o que possui qualquer outra virtude, necessite das coisas indispensáveis à vida, quando está suficientemente provido de coisas dessa espécie o homem justo precisa ter com quem e para com quem agir justamente, e o temperante, o corajoso e cada um dos outros que se encontram no mesmo caso; mas o filósofo, mesmo quando sozinho, pode contemplar a verdade, e tanto melhor o fará quanto mais sábio for. Talvez possa fazê-lo melhor se tiver colaboradores, mas ainda assim é ele o mais auto-suficiente de todos. E essa atividade parece ser a única que é amada por si mesma, pois dela nada decorre além da própria contemplação, ao passo que das atividades práticas sempre tiramos maior ou menor proveito, à parte da ação. 

Além disso, pensa-se que a felicidade depende dos lazeres; porquanto trabalhamos para poder ter momentos de ócio, e fazemos guerra para poder viver em paz. Ora, a atividade das virtudes práticas exerce-se nos assuntos políticos ou militares, mas as ações relativas a esses assuntos não parecem encerrar lazeres. Principalmente as ações guerreiras, pois ninguém escolhe fazer guerra, nem tampouco a provoca, pelo gosto de estar em guerra; e um homem teria a tempera do maior dos assassinos se convertesse os seus amigos em inimigos a fim de provocar batalhas e matanças. Mas a ação do estadista também não encerra lazeres, e — além da ação política em si mesma — visa ao poder e às honras despóticas, ou pelo menos à felicidade para ele próprio e para os seus concidadãos — uma felicidade diferente da ação política, e evidentemente buscada como sendo diferente. Portanto, se entre as ações virtuosas as de índole militar ou política se distinguem pela nobreza e pela grandeza, e estas não encerram lazeres, visam a um fim diferente e não são desejáveis por si mesmas, enquanto a atividade da razão, que é contemplativa, tanto parece ser superior e mais valiosa pela sua seriedade como não visar a nenhum fim além de si mesma e possuir o seu prazer próprio (o qual, por sua vez, intensifica a atividade), e a auto-suficiência, os lazeres, a isenção de fadiga (na medida em que isso é possível ao homem), e todas as demais qualidades que são atribuídas ao homem sumamente feliz são, evidentemente, as que se relacionam com essa atividade, segue-se que essa será a felicidade completa do homem, se ele tiver uma existência completa quanto à duração (pois nenhum dos atributos da felicidade é incompleto). 

Mas uma tal vida é inacessível ao homem, pois não será na medida em que é homem que ele viverá assim, mas na medida em que possui em si algo de divino; e tanto quanto esse elemento é superior à nossa natureza composta, o é também a sua atividade ao exercício da outra espécie de virtude. Se, portanto, a razão é divina em comparação com o homem, a vida conforme à razão é divina em comparação com a vida humana. Mas não devemos seguir os que nos aconselham a ocupar-nos com coisas humanas, visto que somos homens, e com coisas mortais, visto que somos mortais; mas, na medida em que isso for possível, procuremos tornar-nos imortais e envidar todos os esforços para viver de acordo com o que há de melhor em nós; porque, ainda que seja pequeno quanto ao lugar que ocupa, supera a tudo o mais pelo poder e pelo valor. E dir-se-ia, também, que esse elemento é o próprio homem, já que é a sua parte dominante e a melhor dentre as que o compõem. Seria estranho, pois, que não escolhesse a vida do seu próprio ser, mas a de outra coisa. E o que dissemos atrás tem aplicação aqui: o que é próprio de cada coisa é, por natureza, o que há de melhor e de aprazível para ela; e assim, para o homem a vida conforme à razão é a melhor e a mais aprazível, já que a razão, mais que qualquer outra coisa, é o homem. Donde se conclui que essa vida é também a mais feliz.

quarta-feira, 8 de abril de 2015




ÉTICA A NICOMACO - LIVRO 1 - Abaixo as primeiras reflexões do livro Ética a Nicomaco, conforme recomendou o Professor Santoro para a aula da próxima semana (dia 14 de Abril). Quem quiser ler o livro na íntegra, basta acessar o PDF clicando AQUI.


1 

Admite-se geralmente que toda arte e toda investigação, assim como toda ação e toda escolha, têm em mira um bem qualquer; e por isso foi dito, com muito acerto, que o bem é aquilo a que todas as coisas tendem. Mas observa-se entre os fins uma certa diferença: alguns são atividades, outros são produtos distintos das atividades que os produzem. Onde existem fins distintos das ações, são eles por natureza mais excelentes do que estas. Ora, como são muitas as ações, artes e ciências, muitos são também os seus fins: o fim da arte médica é a saúde, o da construção naval é um navio, o da estratégia é a vitória e o da economia é a riqueza. Mas quando tais artes se subordinam a uma única faculdade — assim como a selaria e as outras artes que se ocupam com os aprestos dos cavalos se incluem na arte da equitação, e esta, juntamente com todas as ações militares, na estratégia, há outras artes que também se incluem em terceiras —, em todas elas os fins das artes fundamentais devem ser preferidos a todos os fins subordinados, porque estes últimos são procurados a bem dos primeiros. Não faz diferença que os fins das ações sejam as próprias atividades ou algo distinto destas, como ocorre com as ciências que acabamos de mencionar. 





Se, pois, para as coisas que fazemos existe um fim que desejamos por ele mesmo e tudo o mais é desejado no interesse desse fim; e se é verdade que nem toda coisa desejamos com vistas em outra (porque, então, o processo se repetiria ao infinito, e inútil e vão seria o nosso desejar), evidentemente tal fim será o bem, ou antes, o sumo bem. Mas não terá o seu conhecimento, porventura, grande influência sobre a essa vida? Semelhantes a arqueiros que têm um alvo certo para a sua pontaria, não alcançaremos mais facilmente aquilo que nos cumpre alcançar? Se assim é, esforcemo-nos por determinar, ainda que em linhas gerais apenas, o que seja ele e de qual das ciências ou faculdades constitui o objeto. Ninguém duvidará de que o seu estudo pertença à arte mais prestigiosa e que mais verdadeiramente se pode chamar a arte mestra. Ora, a política mostra ser dessa natureza, pois é ela que determina quais as ciências que devem ser estudadas num Estado, quais são as que cada cidadão deve aprender, e até que ponto; e vemos que até as faculdades tidas em maior apreço, como a estratégia, a economia e a retórica, estão sujeitas a ela. Ora, como a política utiliza as demais ciências e, por outro lado, legisla sobre o que devemos e o que não devemos fazer, a finalidade dessa ciência deve abranger as das outras, de modo que essa finalidade será o bem humano. Com efeito, ainda que tal fim seja o mesmo tanto para o indivíduo como para o Estado, o deste último parece ser algo maior e mais completo, quer a atingir, quer a preservar. Embora valha bem a pena atingir esse fim para um indivíduo só, é mais belo e mais divino alcançá-lo para uma nação ou para as cidades-Estados. Tais são, por conseguinte, os fins visados pela nossa investigação, pois que isso pertence à ciência política numa das acepções do termo. 



3 

Nossa discussão será adequada se tiver tanta clareza quanto comporta o assunto, pois não se deve exigir a precisão em todos os raciocínios por igual, assim como não se deve buscá-la nos produtos de todas as artes mecânicas. Ora, as ações belas e justas, que a ciência política investiga, admitem grande variedade e flutuações de opinião, de forma que se pode considerá-las como existindo por convenção apenas, e não por natureza. E em torno dos bens há uma flutuação semelhante, pelo fato de serem prejudiciais a muitos: houve, por exemplo, quem perecesse devido à sua riqueza, e outros por causa da sua coragem. Ao tratar, pois, de tais assuntos, e partindo de tais premissas, devemos contentar-nos em indicar a verdade aproximadamente e em linhas gerais; e ao falar de coisas que são verdadeiras apenas em sua maior parte e com base em premissas da mesma espécie, só poderemos tirar conclusões da mesma natureza. E é dentro do mesmo espírito que cada proposição deverá ser recebida, pois é próprio do homem culto buscar a precisão, em cada gênero de coisas, apenas na medida em que a admite a natureza do assunto. Evidentemente, não seria menos insensato aceitar um raciocínio provável da parte de um matemático do que exigir provas científicas de um retórico. Ora, cada qual julga bem as coisas que conhece, e dessas coisas é ele bom juiz. Assim, o homem que foi instruído a respeito de um assunto é bom juiz nesse assunto, e o homem que recebeu instrução sobre todas as coisas é bom juiz em geral. Por isso, um jovem não é bom ouvinte de preleções sobre a ciência política. Com efeito, ele não tem experiência dos fatos da vida, e é em torno destes que giram as nossas discussões; além disso, como tende a seguir as suas paixões, tal estudo lhe será vão e improfícuo, pois o fim que se tem em vista não é o conhecimento, mas a ação. E não faz diferença que seja jovem em anos ou no caráter; o defeito não depende da idade, mas do modo de viver e de seguir um após outro cada objetivo que lhe depara a paixão. A tais pessoas, como aos incontinentes, a ciência não traz proveito algum; mas aos que desejam e agem de acordo com um princípio racional o conhecimento desses assuntos fará grande vantagem. Sirvam, pois, de prefácio estas observações sobre o estudante, a espécie de tratamento a ser esperado e o propósito da investigação.

domingo, 5 de abril de 2015

Mora na Filosofia

O historiador e o poeta não se distinguem um do outro pelo fato de o primeiro escrever em prosa e o segundo em verso. Diferem entre si, porque um escreveu o que aconteceu e o outro o que poderia ter acontecido.
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Aristóteles



Felicidade é capacidade de contemplação



Quanto mais se desenvolve a nossa faculdade de contemplar, mais se desenvolvem as nossas possibilidades de felicidade, e não por acidente, mas justamente em virtude da natureza da contemplação. Esta é preciosa por ela mesma, de modo que a felicidade, poderíamos dizer, é uma espécie de contemplação.

Aristóteles /Ética a Nicómaco